Coletivo Instrumento de Ver - Correio Elegante - Carta VI - Forte Cultural

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domingo, 10 de maio de 2020

Coletivo Instrumento de Ver - Correio Elegante - Carta VI


Oi gente, 

por aqui o tempo se dilatou. Sem a urgência da novidade, os sentidos se confundem e recriar os sentidos nem sempre é tão poético como parece. As perdas atravessam e desmontam estruturas, às vezes caducas, às vezes bases das nossas subjetividades. Isso não é necessariamente tranquilo.

Já tem quase dois meses que, como que por obrigação, passamos tempo tentando absorver o que significa estar do lado de dentro, caber dentro de casa. Uma espécie de Alice no país das desmaravilhas, se atrapalhando com os vidros mágicos, ora grande demais pra aquele espaço, ora minúscula, flutuando em um imenso vazio. Às vezes não sabemos porque Alice entrou naquele buraco. 

Com as portas trancadas, resolvemos abrir as janelas e deixar o vento soprar. Junto com essa brisa leve que trouxe a chuva (talvez a última da temporada, anunciando o tempo seco), vieram boas novas, novos parceiros e novas possibilidades. E como a presença é impossível, a ausência faz companhia. Juliana Caribé, a fotografa invisível, entra na sala e enxerga as sutilezas. Dia desses ela fotografou a Maíra. Dessa visita surgiu uma nova parceria e é claro que vocês serão contemplados. Temos cupons de descontos para aqueles que querem registrar seus dias de quarentena à distância, é só entrar em contato com ela e falar que é parceiro do Instrumento de Ver. Entre lá no perfil dela e se deliciem.

Mesmo com as energias desequalizadas, comemoramos a conquista de conseguir pagar as contas do mês de abril da galpoa - foram 55 pessoas contribuindo com o nosso chapéu virtual, dentre amigos, desconhecidos, anônimos ou identificados, somos muito gratas à essa trama sensível e cuidadosa. A previsão do tempo, ainda assim, segue imprecisa e tomamos um tempo pra pensar, sentir e chorar nossos lutos. Sim estamos em luto, sentimos falta dos amigos, da família, das apresentações, dos ensaios, das aulas, dos encontros… a morte tem chegado cada vez mais próxima. Sentimos falta e, aos poucos, vamos velando os nossos mundos conhecidos, onde construímos nossa história. Vínhamos colhendo os frutos de um trabalho sério e dedicado, agora estamos de olhos vendados diante da perda de um futuro. Na janela de casa, tentamos avistar a esperança e ela brilha, bem singela, no final do horizonte. O que você vê da sua janela? 



Essas são algumas das fotos do ensaio que o João Saenger propôs, a gente mal se cabendo dentro de casa. Tem mais na exposição virtual que lançamos hoje, aqui no nosso site. Ao longo da semana vamos acrescentando mais imagens. Esse limite entre o interno e o externo parece cada vez mais incerto. Não sabemos de quem foi a decisão de isolamento. Desgovernados, o pacto coletivo parece sutil ou subjetivo demais em alguns momentos. Por aqui só saímos em situações emergenciais. Ou para receber cookies e plantinhas de presente no portão de casa. Reafirmamos essa escolha pessoal pela vida. Temos que relembrar disso sempre, para reafirmar o sentido de olhar pra fora e encarar o medo. O medo, não nos esqueçamos, é um dos nossos melhores recursos de sobrevivência. Como artistas circenses que somos, colocando nossos corpos em risco em diversos momentos, sabemos disso muito bem.

Como disse o coelho para Alice "A única forma de chegar ao impossível é acreditar que é possível". Conversamos na semana passada com a Carol Monteiro sobre nosso trabalho que parece tão impossível para alguns, mas é o único caminho possível para a gente. Quer dar uma espiada? Tá disponível bem aqui

Aos poucos vamos criando novos hábitos, um pouco de álcool aqui, um desinfetante ali, uma máscara para compor o visual, mas sempre mantendo aquela velha mania de mexer o corpo e cuidar da alma. A Bela segue puxando uns treininhos sempre às terças e quintas as 8:30 da manhã. Quem quiser começar o dia bem é só chegar.


Mesmo que o calendário na parede não faça mais sentido, domingo é dias das mães. Estamos aqui, umas com filhos, outras sem as mães. Em casa nos deparamos com a escolha estática das pessoas que podemos conviver ou da solidão. Uma escolha congelada, sem trânsito. Agora, às vezes, a maior prova de amor é a distância. Mas sempre dá pra fazer um agrado, mesmo que de longe. Amanhã faremos o sorteio da rifa do kit cuidadoso carinhoso que preparamos com produtos que ganhamos de parcerias mais que especiais. Nesse kit tem duas máscaras e uma necessária feitas pela tia da Maíra, a Marta, da Ehpipicnic e produtos de beleza e autocuidado artesanais e naturais feitos pela grande amiga Anna Flávia, da Saboaria Annaromas: um sérum facial, um óleo corporal e um sabonete em barra. As rifas estarão sendo vendidas até 10:30, se bobear ainda dá tempo de você comprar uma para presentear a sua mãe ou a mulher que ocupa esse lugar pra você. O sorteio vai ser às 11h. O passo a passo está explicadinho lá no nosso perfil do instagram. Aproveita pra conhecer essas marcas de Brasília, encabeçadas por mulheres, que fazem tudo artesanalmente e com muito capricho, pura alquimia. 

Da varanda olhamos pra fora, de olho nos passos de outros artistas. Amanhã vamos assistir mais um vídeo no nosso Cine Circo: O Guardador de Rebanhos, do português João Paulo Santos. Depois da exibição faremos um bate-papo com o criador, estão todos convidados! O Guardador de Rebanhos é um vídeo-circo de 2012, inspirado em um poema de Alberto Caiero, que mescla o ambiente com a graça dos movimentos, criando um universo surrealista. Segue um trechinho do poema desse heterônimo de Fernando Pessoa para inspirar o nosso encontro:



Assim como o poema, o video nos convida à contemplação. Vamos nos permitir esse outro tempo, um momento de descanso, deleite e conversar sobre arte. E, principalmente, vamos nos encontrar, porque seguimos buscando como se dão os abraços virtuais. 

Cine circo

Sábado 09 de maio às 20h, 


Essa é mais uma das nossas ações de quarentena para sobreviver neste momento tão difícil para toda a cadeia artística. Mais do que nunca, fica cada vez mais claro que só podemos contar com vocês. Para isso estamos rodando o chapéu, aceitando doações nas nossas contas:


Continuamos acreditando nas fronteiras abertas e, de tanto acreditar, elas se abriram. Recebemos convidados do mundo todo para o nosso aconchegante grupo de leitura, tem gente em Londres, Barcelona, Santiago, interior da França e diferentes estados do Brasil. O que nos une? Um texto, a vontade de conversar, e esse desejo de trocar e renovar as ideias. Nas últimas duas semanas conversamos com o diretor canadense radicado no Chile, Allain Veilleux. Falamos sobre a criação circense e sobre como criar em tempos de crise, ou melhor, de ruptura. Essa conversas mobilizaram Alain, que está agora pensando na direção de miniaturas de circo online, saiba mais lá pelo facebook dele.


Nessa roda são todos bem vindos, quer entrar? Manda um email que te passamos o texto e o link do próximo encontro que vai acontecer na quarta-feira 13/05 às 14h. Dessa vez vamos ler o artigo que chegou pra gente indicado pela Raquel Karro, “Estávamos prestes a fazer a revolução feminista… e então chegou o vírus”, de Paul B. Preciado. Vamos falar sobre ritualizar, sobre como deixar as experiências atravessarem os nossos corpos.

“Aonde fica a saída?", Perguntou Alice ao gato que ria. 

”Depende”, respondeu o gato. 

”De quê?”, replicou Alice; 

”Depende de para onde você quer ir...”

Nessa malemolência entre vida virtual e mundo real, seguimos acreditando que nossa saída é essa rede de amor que viemos construindo nesses 18 anos de coletivo. Colaborem com nossa campanha e acompanhem nossos próximos movimentos (por hora só podem existir na vida virtual). Estamos cheias de ideias e vamos, nesse novo ritmo, colocando elas em prática. Vocês são essenciais para a criação de novos mundos e seus novos horizontes, para que possamos ver para além das nossas janelas.

Agora estamos aqui no batente, na sacada, acenando pra vocês de longe, mantendo a distância mínima de dois metros, mas com uma vontade enorme de abraçar.

Com amor, Bela, Bia, Julia e Maíra.


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Um pouco atrasado, mas não deixo de registrar mais uma carta do grupo. Tenho tido problemas com minha conexão, mas resolvo logo.

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