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terça-feira, 21 de setembro de 2021

Imortal

Escrevi em 08 de maio de 2017
Cabo Branco - PB
Foto: EdiSilva
EdiSilva

"Acho que descobri a fórmula da imortalidade: é morrer.
Depois de morto, duas possibilidades: vida eterna e não morre mais; não existe nada e também não morre mais.
Na segunda hipótese, também ninguém mais vai sofrer com a possibilidade da sua morte. Você simplesmente desaparece. Vira uma névoa, que some na distância do tempo."
Ele falou isso como se não soubesse como era na realidade. Depois foi embora.
Bom, só o quê eu tenho certeza é de que não sei quando ou se vou vê-lo novamente. Da última vez, foram quatro anos.
Ele chegou e me contou umas estórias. Tristes. Era algo dele. Sempre contava estórias tristes. O engraçado é que depois eu me sentia melhor.
Sim! Agora começo a juntar as partes. Nada era acaso. 
Sempre que eu precisava de algo, tinha um problema que me consumia, ele chegava, falava de suas coisas, verdadeiras ou falsas, mas sempre de forma que me jogava para cima. E dava certo.
Mas só agora eu percebi que não era acidental.
Perdi a casa, não tinha como resolver isso, não tinha onde morar. Ele veio. Andava de um lado para o outro. Era sempre assim: andando, inquieto, falando. E eu ficava embevecido, ouvindo, quase sem pensar, mas visualizando também. Via tudo como num filme. Frame a frame. Em preto e branco. Sim! Em preto e branco. Nunca havia me dado conta antes de que ele sempre vinha em preto e branco. Porque? Eu acho que a fotografia sem cores mostra melhor a realidade. Ou, pelo menos, a embeleza mais. As cores que ela esconde, parecem ficar ali, por trás da esquina, nos espreitando, querendo surgir. Rindo de nós. Há um brilho intenso, que parece avivar melhor o mundo e isso o faz explodir em cores. E tudo é solucionado. Passo através dos problemas.
Engraçado. As cores surgem vivas do preto e branco.
E agora, depois daquela morte… Olha, eu já podia pensar naquela morte sem o vazio, a pressão no peito, o peso sobre minha cabeça! Aquela estória tinha novamente me ajudado. Eu já podia aceitar a ideia da imortalidade surgindo da morte e isto me ajudava a seguir.
Olhei pela janela. Vi ainda a foto dela no grande outdoor e podia até sentir a presença. E não havia dor.
Até a casa, que eu já pensara em vender, parecia mais aceitável. Não havia mais a necessidade dela, pois, de alguma forma, ela estava ali.
Era agora uma religião própria, onde, ao invés de adorar, falar, sentir a presença e forjar as respostas de um deus nascido de outros, eu o fazia com a deusa que eu havia recém criado.
E era paz.
Um café, banheiro e a rua! A luz novamente brilhava. Um brilho meio… preto e branco.

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