Coletivo Instrumento de Ver - Correio Elegante - Carta XI - Forte Cultural

Breaking

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Coletivo Instrumento de Ver - Correio Elegante - Carta XI


Ô de casa! Licença pra ir entrando… Tamos aqui, chegamos! 

Somos nós, somos um coletivo, uma coletiva, somos quatro, somos muitas. Nos apresentamos aqui, à sua disposição:

Julia 

Tenho os olhos tristes, não é à toa. Me criei pela melancolia mas, ainda cedo, me rebelei. Ser alegre é minha sobrevivência, revolução. Se me virem gargalhando por aí, é protesto. Nasci filha de quem partiu e de quem ficou. Eu sou a parte que fica. Não sou a cara de ninguém, sou colagem. Então não estranhem minha insistência em falar de mim, porque na verdade estou falando de vocês. Se você quiser se reconhecer em mim, posso te mostrar o que você tem de melhor. Porque, no fim das contas, sou eu quem escolho a minha parte, a parte que me cabe. Vivo assim, com essa urgência, o desespero calmo de saber que a vida vai caminhando rumo à morte, e pode ser que não dê tempo de fazer tudo o que se quer, quando se sonha muito. Eu queria ser musa inspiradora, mas achei mais divertido ser artista. Eu vejo o mundo como um circo, crio vários circos nesse mundo. Rôo unha, falo sem pensar, (ou fico semanas ruminando o certo a ser dito), fico entediada fácil, só funciono apaixonada (é minha melhor versão), mudo de humor de uma hora pra outra, tenho poucos amigos, mas gosto de estar entre muitas pessoas, penso em um monte de coisa ao mesmo tempo, durmo de bruços, gosto de lavar louça, me identifico com pelo menos um personagem em todo filme que assisto, acho que o mundo tinha que ser diferente, passo os dias tentando entender as pessoas, tenho vontade de guardar quem gosto embaixo do travesseiro, tenho sempre pelo menos uns cinco planos de vida que nunca vou realizar, ser feliz pra mim é viajar, tenho coisas escritas em vários cadernos diferentes. É tudo mentira: ser eu é me perder em possibilidades. Essa disposição de criar e abandonar teorias sobre mim mesma. Muito menos que isso e muito mais que isso. O que você acha que sabe de mim é espelho.

Beatrice

Acrobata desde que me lembro por gente, sou formada em nenhuma escola de circo do mundo. Já fui ginasta da seleção nacional, diva de circo norte-americano, já pulei, voei, portei, girei, dancei e até caí em cena. Já tive a vida por um triz, fui salva pelos anjos e me pendurei pelos pés, de ponta cabeça, no breu total. Já saltei de pára-quedas e vivo a vida nos ares, mas tenho medo de altura. Meus olhos são pequenos, mas atentos. Meus dentes separados já não me incomodam mais, dizem até que é charme. Finco os pés no chão e alongo os braços para o alto todos os dias. Quando me percebo, já estou com as mãos no chão tentando ver um outro mundo de cabeça para baixo. Minha casa é meu refúgio e só se entra descalço e despido de qualquer julgamento. A coragem é minha companheira desde pequena e o medo, uma carranca aliada. Eu abraço o mistério com as mãos geladas e as pernas tremendo. Aprendo com o meu corpo e falo com o mundo a partir dele. Sou a mais babona dos amigos talentosos. Minha voz é baixa e não tão firme. Tento dizer várias coisas, mas as ideias se embolam mais do que os meus cabelos embaraçados. Já desisti de pentear. Não sou branca, não sou negra, não sou parda, o sol me cai bem e diz de onde eu venho. Carrego em mim uma porção de sangue indígena e, na pele, o orgulho da minha ancestralidade. Não sou de família circense, mas descobri, recentemente, que meu avô Sylvio foi o palhaço Pepino no Circo Robatiny, na Campinas do século passado. A minha mãe, criança, adorava passear na elefanta Fátima. Sou a trapezista do trapézio mais baixo do mundo. Estou treinando para ser a acrobata mais velha de todos os tempos. Vai demorar um pouco, ainda, mas nem tanto. O amanhã vem num piscar de olhos, num suspiro. Um sopro.

Maíra 

Começar falando de como eu acho que vou dar conta de tudo e, inevitavelmente, meto os pés pelas mãos, talvez seja a melhor forma dizer oi. Um metro e cinquenta e seis de altura e 48 quilos, um corpo pequeno que não parece frágil. Todos pensam que sou brava. Todos pensam que sou forte. Sou mesmo! A tranquilidade de ter um humor aguçado e saber rir de mim mesma nem sempre pode ser vista por aqueles que não me conhecem. Devota de nossa senhora desatadora dos nós e filha de Iansã, não olho para o passado, nostalgia não é uma palavra recorrente no meu vocabulário. Ao longo dos anos descobri que choro por necessidade. É do meu corpo, é genético, é natural, é essencial pra mim. Choro por tudo ou quase tudo. Assim mesmo quando menos quero meus olhos enchem de lágrimas. Pode ser assistindo tv ou numa conversa de bar. Muitos anos segurando o choro me travaram o pescoço. Agora já sei, sou pancadas fortes de chuvas isoladas. Queria ter mais amigos e viver sempre em grupo, mas não abro mão das alegrias de estar só. Posso conversar por aproximadamente 48h seguidas sem intervalo. E qualquer assunto é digno da minha atenção. Tenho uma queda por mulheres corajosas, ando sempre entre elas e com elas. Me confundo com o outro. Não sei como é meu reflexo no espelho e esqueço qual é minha idade. Se não fosse artista eu não seria. Visceral, bélica, sensível e cuidadosa são algumas das contradições que moram em mim. Se você vier na minha casa vou sempre te servir algo para comer, sempre! Se você me chamar pra um café, uma boa conversa no bar, uma festinha para poucos, nunca vou negar. Se você me chamar pra uma balada, um showzão ou um frevo muito do animado eu vou sempre arrumar uma boa desculpa para não ir. Na hora de ir embora, não sei me despedir, sem jeito vou saindo rápido e sem muita formalidade.

Bela 

Filha única desde sempre, mesmo com algumas irmãs perdidas pelo mundo. Me sinto sempre sozinha. Com um bom ditado sempre na ponta da lingua eu diria "mais qualidade e menos quantidade". Sim, sou uma pessoa de poucos amigos, mais cuido dos que tenho de um jeitinho muito especial. Fazer é meu verbo, sempre ativa, faço muitas coisas ao mesmo tempo. Multitarefa é uma palavra que habita meu cotidiano. Carrego um mundo todo nas costas, às vezes fica pesado, mas sigo sempre esperançosa me inspirando, meditando ou lendo para encontrar caminhos mais divertidos de levar a vida. Indecisa por natureza não sei se sou psicóloga circense ou circense escaladora ou talvez a melhor opção é juntar tudo! Sim, eu dou conta! Ser mãe é um sonho realizado. De mim, surgiram duas meninas lindas. Sem elas, não sei de onde tiraria minha força para estar nesse mundo. Romântica, um bocado carente e ciumenta, estou sempre pronta pra afagar minhas amigas ou mimar alguém que precise de um chamego. Obsessiva com organização. O circo é meu desafio, me lembra todos os dias de ser mais gentil comigo. Converso com as plantas, cuido dos cachorros, me emociono com qualquer coisa, oscilo todas as semanas entre fada sensata, diaba da fúria, sensível com tudo e maga eficiente. Em qual desses eu estou essa semana?


Aqui estamos, criando caminhos para percorremos juntas e juntos. A pandemia nos assustou e continua assustando, mas ela não vai nos paralisar. Nestes 131 dias de isolamento social, nos empenhamos em adaptar nossas ações para o meio virtual, tivemos que reinventar o que já estávamos reinventando. Para conseguir manter a nossa galpoa, realizamos diversas rifas com premiações carinhosas, transmitimos 32 treinos online (terças e quintas, sem falta), 9 sessões de cine circo (vídeos circenses e bate-papos), além dos 9 encontros de leituras e estudos e outros 4 só para os professores de circo do DF. Tudo isso banhando as nossas cartinhas virtuais enviadas para a caixa postal de quem quisesse receber as notícias do lado de cá. Todas as nossas ações têm acontecido GRATUITAMENTE. Quem neste mundo tem o privilégio de ter acesso a internet, pode participar e contribuir com o que quiser e puder:

BANCO 260 NU PAGAMENTOS SA

INSTRUMENTO DE VER

AGÊNCIA 0001 . CONTA 78926220-7

CNPJ: 30.478.794/0001-64


BANCO DO BRASIL 001

JULIA HENNING CAMPOS

AGÊNCIA 3603-X . CONTA POUPANÇA VAR.96 14422-3
CPF: 348.530.731-91

Com tantas incertezas e inseguranças, continuaremos executando a nossa programação pandêmica, reafirmando o nosso compromisso de destinar 25% de tudo que arrecadamos para a #redecircobrasilia. Até agora já repassamos R$ 3.672, totalizando o valor de R$ 7.105,14 que puderam ajudar famílias circenses itinerantes e outros artistas com dificuldades ainda maiores que as nossas. 

A Galpoa segue fechada. Estamos bolando um plano para re-abrirmos as portas sem virar as costas pra realidade. Vamos aos poucos, um passo de cada vez, afinal o circo é risco e, também, amor. Amor pelas infinitas possibilidades de mexer o corpo, das múltiplas habilidades em manusear e equilibrar objetos, os outros e a si próprio. De nos colocarmos em risco, mas nunca em perigo. Prezamos a vida.

Desistimos de tentar entender e já não consultamos mais os horóscopos, enquanto houver vida e amor seguiremos fazendo. O futuro vai acender a luz e nele poderemos ver tudo bem mais claro no passado. Hoje a gente inventa. 

Esses próximos dias teremos nossas tradicionais performances pandêmicas. Um desdobramento contemporâneo de uma arte antropofágica que vem nos alimentando: 
  • Um respiro para corpo nas aulas da Bela sempre às terças e quintas de 8:30 as 9:30
  • Rifa de uma calça perfeita feita pelo estilista mais dançarino dos últimos tempos. Cada número da sorte custa apenas R$10,00 e o sorteio acontece ao vivo no instagram.
  • Domingo que vem, dia 26.07, teremos CINE CIRCO e bate-papo descontraído com a Adelly Constantini, acrobata, criadora, diretora, professora e produtora circense carioca, pousando seu mais novo vídeo na nossa sala virtual. Para assistir, você pode acessar aqui, a partir das 17h.
  • Um encontrinho na esquina com o pessoal do grupo CIRCUS, o grupo de pesquisa e estudos das artes circenses da UNICAMP.

  • Um Papo Reto com a Julia com o no Instagram do Saulo Pinheiro, na terça-feira dia 28.07 às 20h.

  • Uma conversa animada feita só por perguntas sem respostas, nosso Grupo de estudos. Já questionamos o contemporâneo, a antropofagia e agora na quarta-feira 29/07, às 14h a pergunta da vez é: *Como se transforma um corpo acrobático no confinamento?* Quer participar? É só chegar!
  • Para lavar a louça em boa companhia tem podcast. A segunda parte da conversa marota entre a Julia Henning, o Rodrigo Mateus e o Zezo Oliveira, a convite da Cia Catavento com a mediação de Felipe Nicknig já está disponível no Spotify!
  • Esse mês estamos na Revista Traços! Você pode conferir a versão digital ou comprar 10 unidades da versão impressa pelo site. Para quem não conhece, a Revista Traços, é uma das publicações mais interessantes da cultura do DF, com um olhar forte para a diversidade e um compromisso com a inclusão.

E como ontem e hoje foram dias de festa por aqui e na França, vamos encerrar com um brinde bem alto à Beatrice e à Maroussia! 

Viva a Bia!

Viva a Maroussia!

Viva a Vida! 

Viva o Amor! 

Vamos indo então, fique bem, abre a porta que é pra gente voltar :)

  • Curta a página do Forte Cultural no Facebook
  • Curta a página Resistência no Facebook
  • Siga o Forte Cultural no Twitter

Nenhum comentário:

Postar um comentário