Coletivo Instrumento de Ver - Correio Elegante - Carta VIII - Forte Cultural

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segunda-feira, 25 de maio de 2020

Coletivo Instrumento de Ver - Correio Elegante - Carta VIII


FUTURO:
Você está viva, talvez a melhor das notícias. Você respira, às vezes mais fundo, às vezes demoradamente, dependendo do nível de adrenalina. Seu corpo envelheceu e às vezes você nem lembra, às vezes sim, com orgulho de tudo o que atravessou a sua pele. Você se arriscou e se sente corajosa. Seus cabelos estão mais brancos, mas isso não é nenhuma surpresa. Você se preocupa com outras coisas que não pôde imaginar. Você ainda se preocupa com o que vai cozinhar amanhã, se esqueceu a janela aberta antes de sair ou com o amanhã.
PASSADO:
Você olha para o alto e se vê lá em cima. Você cresce, alcança o espaço na ponta dos pés. Você gira, ampla, espaçosa. Se sente grande, adulta. Você pode fazer coisas que hoje ainda não pode. Lá você sabe outras coisas. Você não se vê confinada, mas sim livre, pode voar. Quando voa é como se estivesse nadando de peito, abraça o ar com as pernas e empurra. Toma o ar. Respira. 

PRESENTE:
Respira. Solta o ar nesse suspiro de quem está alerta. Estar alerta é cansativo. Se o ar fica rarefeito, se o pulmão fecha, expira pra espantar o medo. Depois inspira. A brisa traz novas ideias, frescor, foi ela que trouxe mais um presente para colocarmos à sorte. A rifa dessa semana é uma vaga nas turmas de yoga da Sarah Dorneles que ela está ministrando online. Já comprou a sua? Que não nos falte ar! A ideia das rifas foi surgindo devagarzinho e, de repente, se tornou uma opção para manter a galpoa viva. O sorteio será neste domingo. Semana que vem a sorte vai para a pintura “o paradista”, de Betu Souza, artista visual e circense em realidades paralelas. E, por falar em realidade paralela, alguns cientistas agora deram para “criar” multiversos. Seriam os cientistas artistas? Nesse universo paralelo, o tempo passa ao contrário. 


PRESENTE:
Fecha os olhos. Imagina um futuro. Tá vendo? Parece que não, mas ele ainda está lá. Esteve embaçado, atrás das suas lágrimas de medo. Ele é o que você imagina. Um dia fomos sonhados. Um dia esse mundo em que vivemos foi imaginado. Esse corpo-mundo, deve ser recriado para longe da lógica colonialista em que estamos seguindo, a lógica do progresso, do domínio, do poder. Fecha os olhos. Imagina um Brasil, um país gigante, múltiplos corpos convivendo, quadris soltos, onde cantamos com alegria as nossas tristezas e o abraço é patrimônio nacional. Convoque esse país. Sonhe com ele. Nesse Brasil os meninos negros não são mortos dentro de casa. Nem na esquina. Tampouco os gays e as mulheres.

Nos últimos dias lemos juntos sobre a defesa de um outro tempo, em que o hoje se mistura com o passado e com o futuro. Nossos corpos carregam uma lembrança estranha, a certeza de não saber como foi essa história contada apenas por uma das partes. Aqui, no nosso grupo de leitura, vamos confiando no que ainda não existe e acreditando que algum deslocamento é possível, lendo autores que bagunçam as nossas certezas. Se você também anda precisando mudar os ares e borrifar um pouco de ar fresco nos seus pensamentos, só nos mandar um email para participar dessa conversa. 

FUTURO:
Agora você não se preocupa mais com a floresta, ela nunca esteve tão radiante e habitada pelos povos originários, andando por onde querem, estão nas universidades, florestas e nos espaços de poder. Estamos todos aprendendo cada vez mais sobre as plantas. As crianças ouvem causos. Os velhos contam causos, não como a dar lições, mas como que repetindo o passado. A cada conto um novo ponto. Os corpos estão livres. Em cor e gênero. Isso foi um efeito do futuro. Os corpos foram recriados da maneira como foram sonhados.

PRESENTE:
Escuta o corpo. Sente o peso nos seus pés, alongue as costas. Quer companhia, uma condução suave? A aula da Bela é uma boa opção, é só entrar nessa sala, você já sabe onde é, e tirar a poeira das juntas, sempre às terças e quintas, às 8:30.

PASSADO:
Olha para trás, quem é que leu esta carta? O que mais você leu, além do que está escrito? Inventou entrelinhas? Criou imagens? Escutou alguma música? Quando você olha pra trás, você desenha a sua história ou faz um filme com ela? Tem trilha sonora? O que você estava sentindo? O que você fez com aquela tristeza toda? Deixou atravessar, encharcou, ou guardou e construiu um altar? O que você fez com a euforia? Produziu, contagiou, ou ofuscou o olhar? 

Não é mais possível identificar o que é sonho, realidade, déjà vu ou uma lembrança distante. Deixamos os encontros sacolejar a vivência do tempo. Deixamos a arte falar da vida, essa que a gente cria. Esse tempo fora do tempo que revive o futuro e reconstrói o passado. A arte grita "eu não morro". Ela reinventa, questiona, sugere, reflete, emociona, toca, nos lembra da brevidade e da imensidão da vida. Existe antes e depois? Nosso tempo é o que a gente cria. Cada uma com uma palavra, um ritmo, um gosto. Continuamos a convidar vocês a contribuírem, assim vamos criando juntos um outro agora:


BANCO 260 NU PAGAMENTOS SA
INSTRUMENTO DE VER
AGÊNCIA 0001 . CONTA 78926220-7
CNPJ: 30.478.794/0001-64

BANCO DO BRASIL 001
JULIA HENNING CAMPOS
AGÊNCIA 3603-X . CONTA POUPANÇA VAR.96 14422-3
CPF: 348.530.731-91


Em um passado não muito distante a Rede Circo Brasília, para onde destinamos 25% de todas as nossas arrecadações, adoçou nossos dias e deixou o futuro cheio de esperança. Afinal de contas, a esperança precisa de prática. Nas fotos você vê o Lucas Lírio entregando as cestas nada básicas e contagiando de simpatia nossos colegas dos circos de lona armados aqui no DF. Já conseguimos vislumbrar as próximas ações. Essa cadeia de amor que se constrói a partir da escuta e da gentileza será uma das moedas mais valorizadas no nosso novo mundo.


É nesse sonho que se concretiza que sentimos o tempo e nos permitimos a repetição. A vida também é repetição. A criação também é uma repetição. Assim nos lembra Manoel de Barros.

“Repetir, repetir - até ficar diferente
repetir é um dom do estilo”

Repetir é ensaiar. Assim, com muito ensaio, muita repetição, foi criado Vin\co, um espetáculo que é, também, sobre o tempo. A proposta do diretor Édi Oliveira é a de nos colocar em um outro tempo, essa experiência que talvez só seja possível através da presença. Vin\co estreou há exatamente um ano, e agora está em cartaz de novo. Só que agora diferente. Chamamos o Leonardo Shammah e a Carolina Hofs para escrever a partir dessa outra experiência de assistir o espetáculo pelo vídeo.




Vin\co proporciona uma experiência de pausa, desaceleração, aquietamento, de desfrute dos sentidos pelos ruídos do silêncio e de contemplação dos vazios cheios. Vin\co é uma realização dançapequena e Instrumento de Ver. Com Daniel Lacourt, Édi Oliveira e Julia Henning em cena. A trilha sonora é assinada por Euler Oliveira, com desenho de luz de Moisés Vasconcellos e figurino de Roustang Carrilho. A produção foi concebida por Kamala Ramers, Julia Henning e Maíra Moraes. Vídeo de Cícero Fraga. Imagens captadas por Cícero Fraga, David Alves e Thaís Mallon. O espetáculo teve sua pré-estreia na programação do MID - Movimento Internacional de Dança e seguiu em pequena temporada em maio do ano passado. Foi premiado no Prêmio Web de Teatro Candango.

PRESENTE:
Esse é um convite para amanhã. O link para o vídeo do espetáculo completo está disponível aqui, só clicar. Amanhã, sábado, 23.05, às 20h, nosso cine circo vai contar com a presença do Édi Oliveira e parte da equipe de criação, para assistirmos, juntos, um trecho e conversar sobre o espetáculo a partir dos escritos do Leo e da Carol. 

FUTURO:
Em um futuro não muito distante, será votada uma lei para solucionar o agora. Ainda precisamos de leis. Agora mais do que nunca. O Projeto de Lei 1075 nos dá uma solução imediata para a crise que estamos atravessando. Terça-feira é a primeira fase da votação. Ela prevê auxílios emergenciais para artistas e espaços culturais. A gente precisa muito deste auxílio. É urgente. A gente conta com a ajuda de toda a população.

Nessa mistura entre passado, presente e futuro o tempo corre, as crianças crescem e o coração não para. Como um segredo guardado em uma cápsula do tempo, a vida se constrói. O tempo ultrapassa os corpos e se estende nessa linha "des"cronológica do tempo. Lembra quando você achou, no álbum de fotos antigas da família, a foto de um bebê igualzinho ao seu filho?

ETERNO:
Incorporar o passado, o futuro e o presente ao mesmo tempo nos deixa livres e permite o sonho, novos mundos. Nesse exato momento em que escrevemos essa frase o tempo passa e as escolhas feitas são consequências escritas nas linhas tortas desse futuro não muito distante que é o ponto final. Agora, já no passado, só resta assumir as responsabilidades das escolhas e seguir nesse constante moinho de vento.



Para abrir os caminhos e transformar esse passado-futuro fadado ao fim do mundo, vamos evocar o Tranca Rua, exú responsável pela limpeza astral dos caminhos do mundo. Vamos, literalmente, trancar a rua e abrir a janela. Para nos manter conectadas e criar assunto nessa nossa rede virtual, convidamos você a marcar #trancaruaabraajanela, @instrumentodever e sonhar do lado de dentro. Veja aqui a nossa brincadeira com o João Saenger. É brincando que a criança inventa o mundo... e quem aqui já foi criança?

Nós somos o amanhã que sonhamos ontem.

Conta, o que você sonhou ontem? E o que você sonha pra depois?


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